quinta-feira, novembro 23, 2006

A Vida e a Morte

"Ser ou não ser, eis a questão. O que é mais nobre para o espírito? Sofrer os golpes e os dardos do ultrajante destino, ou pegar em armas contra um mar de infortúnios, e acabar com eles, fazendo-lhes frente? Morrer, dormir, nada mais. Pensar que, com um sono, pomos fim ao pesar do coração e aos mil conflitos naturais que constituem a herança da carne. Eis um fim ardentemente tentador. Morrer, dormir: dormir, sonhar talvez. Sim, está aí o obstáculo. Que sonhos podem vir durante o sono da morte, depois de nos termos libertado deste invólucro mortal. Isto deve fazer-nos pensar. Será esta a razão que transforma em calamidade uma longa vida. Pois quem aguentaria os ultrajes e o desdém do mundo, a injúria do opressor, a afronta do orgulhoso, o desprezo do amor desejado, o atraso da justiça, a arrogância do poder e o vexame que o mérito paciente recebe do indigno, podendo sozinho procurar o seu repouso com um simples punhal? Quem quereria suportar tão duros fardos, gemer e suar sob o peso de uma vida esgotante, se não fosse o medo de qualquer coisa após a morte, essa ignorada região de cujos limites nenhum viajante retorna, medo que confunde a nossa vontade e nos faz suportar os males que nos afligem em vez de nos lançarmos a outros que desconhecemos? Assim a consciência faz de todos nós uns cobardes; assim o primeiro impulso da decisão esmorece com a palidez do pensamento, e os empreendimentos de grande envergadura e importância desviam, por esta razão, o seu curso e perdem o nome de acção. Sossega agora!"
Hamlet, Shakespeare
Hamlet, após ter conhecimento que o seu tio matou o seu pai para lhe usurpar o trono, vê-se envolto num mar de dúvidas, hesitando entre a vida e a morte. E numa coisa parece estar certo: tememos a morte porque não sabemos o que vem depois dela. Contudo, parece também haver quem, perante a visão que tem da sua vida, prefira morrer. Hoje saiu uma notícia no jornal que se refere aos suicídios e mutilações entre os jovens. Suponho que o desespero que se tem em vida supere o medo que se tem da morte e, pondo os pratos na balança, a morte pareça mais atractiva. O suicídio é um fenómeno que, apesar de tudo, tem alguma expressão e há alguns casos conhecidos de pessoas que tomam imensos comprimidos para acabar com o sofrimento na sua vida; nalguns casos sem sucesso, o que leva a pensar se desejavam mesmo suicidar-se. Na verdade, a morte sempre parece ter causado algum fascínio, para além do terror que provoca. Desde há muito que se tem conhecimento de cerimónias fúnebres e cultos dos mortos e há representações da morte muito conhecidas, como aquela em que a morte se veste de preto com um capuz e carrega uma foice, com ela retirando vidas, numa imagem terrífica e assustadora. Mas ainda hoje a morte exerce fascínio e provoca não só dor, como também prazer (penso que é isto que faz com que os filmes de violência tenham tanto sucesso; talvez seja ainda porque na vida real não temos tantas oportunidades de ver essa violência e assim junta-se a curiosidade ao prazer). Também sinto algum fascínio pela morte, mas tomo-a por algo negativo, caso contrário seria legítimo assassinar. Parece-me que a morte é um dos temas mais sérios que existem, pois representa o fim das oportunidades, da esperança, deve representar a maior angústia que pode haver e representa também o desconhecido que, o mais provável, para sempre ela será. Parece-me que o principal problema da nossa vida é mesmo ter de morrer, pois se assim não fosse viveríamos tranquilamente, ninguém morreria à fome e teríamos o conforto de saber que tínhamos tempo infinito para resolver os nossos problemas; aliás, muitos dos nossos problemas deixariam automaticamente de existir, pois muitos deles resultam da nossa luta pela sobrevivência. Por vezes penso que tudo o que fazemos em vida tem em conta a morte, fazêmo-lo para que possamos morrer bem e tranquilos, sabendo que vivemos com conforto e que gastámos todos os cartuchos que tínhamos, o que não quer dizer que o façamos conscientemente. Mas, no nosso mundo, é necessário que morramos para que outros possam viver e, sendo a morte iniludível, devemos aceitá-la o melhor que pudermos; ainda que tal seja difícil, principalmente quando se é velho e ela está próxima.

quarta-feira, novembro 08, 2006

Mass Of Dots

"When I first came to Los Angeles, it looked like just this mass of dots, all jumbled and disconnected. ...It was pretty disorienting. Sometimes it all still feels like a mass of dots. But more and more these days, I feel like we're all connected. And it's beautiful... and funny... and good!"
Aaron Davis

sábado, novembro 04, 2006

Mito de Atreu e Tiestes

Atreu e Tiestes eram irmãos gémeos, filhos de Pélops. Conta-se que, incitados por sua mãe, Atreu e Tiestes mataram Crisipo, seu meio-irmão e filho de Pélops com uma ninfa. Pélops exila-os e estes refugiam-se em Micenas, acolhidos pelo rei, Euristeu. Durante uma guerra Euristeu deixa o reino à guarda dos irmãos e acaba por morrer. Surge então uma disputa pelo trono, da qual Atreu sai vitorioso. Furioso, Tiestes expõe Aérope, mulher de Atreu, como sua amante, gerando dúvida na paternidade dos filhos destes, Agamémnon e Menelau. Atreu resolve vingar-se do irmão, e convidando-o para um festim onde insiste para que Tiestes coma com fartura, revela-lhe no fim que foi com a mulher e os seus filhos que este se banqueteou dizendo que, ao contrário do que se passava com ele, Tiestes saberia sempre que ele e os seus filhos seriam uma e uma só carne. Enlouquecido com o sucedido, amaldiçoou o irmão e fugiu de Micenas encontrando refúgio em Sícion junto de Pelópia, uma sacerdotisa e sua filha. Certa noite decide seguir Pelópia e as restantes sacerdotisas quando estas iam realizar um sacrifício de uma ovelha preta em nome de Atena. Durante o ritual Pelópia suja-se com o sangue do animal, e acaba por se ir lavar num rio ali perto. Num momento de insanidade Tiestes acaba por cobrir a cara e apodera-se da filha à força. No fim, ao dar-se conta do que tinha acabado de fazer, resolve fugir. Entretanto Atreu, por conselho do oráculo de Delfos resolve chamar o irmão à sua presença a fim de anular a maldição. Quando chega a Sícion não o encontra lá, mas acaba por se apaixonar por Pelópia e, julgando-a filha do rei de Sícion, leva-a para Micenas e casa-se com ela. Passados nove meses têm um filho, que Atreu julga ser dele, mas que na verdade é de Tiestes. Envergonhada pelo filho ser fruto de um acto de estupro abandona a criança num monte para morrer. Atreu consegue encontrá-lo ainda com vida, e dá-lhe o nome de Egisto. Entretanto Agamémnon encontra Tiestes e faz dele seu prisioneiro, pensando que o seu pai ia ficar orgulhoso de si. Atreu porém não teve coragem de encarar o irmão depois do tão horrível episódio do banquete. Egisto sugere então que seja ele a matar o prisioneiro e Atreu consente. Vai ao encontro de Tiestes a fim de o matar, mas este consegue dominá-lo. Ao ver a espada de Egisto, Tiestes reconhece-a como sendo sua e pergunta-lhe onde a encontrou. Egisto conta que foi a sua mãe que lha deu e Tiestes ordena-o que a vá buscar e que lhe diga que o seu pai a deseja ver. Quando Pelópia chega, fica a saber a identidade do seu violador e mata-se com a espada de Egisto. Tiestes manda Egisto matar Atreu, e este obedece ao seu verdadeiro pai. Tiestes torna-se então rei de Micenas.

quarta-feira, novembro 01, 2006

Laços

De certeza que toda a gente já respondeu mal a alguém muito próximo e deixou passar "ofensas" de alguém com quem não tem grande confiança. Eu acho que isto acontece porque aquilo que ouvimos das pessoas que para nós são importantes é que nos interessa e faz moça. Para que queremos nós saber daquilo que quem não nos interessa diz? Esses bem podem falar à vontade que passa ao lado. Mas também acho que temos de ter cuidado com a maneira como reagimos porque, embora por um lado estejamos a mostrar descontentamento por uma pessoa querida nos estar a ofender, por outro essa pessoa pode não ter essa percepção e sentir-se também ofendida. O melhor é falarmos calmamente com quem nos ofendeu, caso a ofensa nos seja relevante, mesmo que às vezes tenhamos de esperar um pouco, pensar sobre o sucedido antes de o fazermos e pôr o orgulho de lado, que às vezes pode ser bem difícil.
O mundo seria um lugar bem melhor sem as mágoas que as outras pessoas nos trazem. Será que posso discordar argumentando que muitas vezes são os entendimentos entre nós e essas pessoas que nos mostram a verdadeira força da amizade e um sentimento de plenitude? Ou será que não os haver implicaria não sentir a falta desta força e portanto estaríamos bem assim como assim?
Eu odeio quando me desentendo com algum amigo, ou quando de alguma forma me sinto afastado de alguém que me faz falta, mas não existe para mim uma altura melhor que aquela em que faço as pazes e sinto que os laços que nos unem se fortalecem. Acho que nestas alturas faz sentido a frase "O que não nos mata torna-nos mais fortes!".
Pior é quando "nos mata"..

Melancolia, Nostalgia e outras...

Existem alturas na vida de uma pessoa em que esta se sente emocionalmente cansada. Alturas como esta, em que sentimos falta de alegria ou simplesmente de motivação para seguir em frente, podem ser causadas por diversos factores. Um deles é a nostalgia. O sentimento de tristeza causado pela saudade de alguma coisa ou de alguém pode ser forte, ou porque não voltamos a reencontrar aquilo de que temos saudades e sabemo-lo, ou até mesmo porque estamos temporariamente afastados de algo que nos faz imensa falta. Outro factor é a melancolia, o simples desgosto que se pode ter pela vida muitas vezes sem aparente razão. O que pode causar a melancolia? Não sei! Talvez o excesso de ocupação do tempo, mudanças repentinas na nossa vida, uma vida quotidiana demasiado monótona, talvez todas estas juntas e talvez nenhuma delas... Já os sintomas, segundo Freud quando uma pessoa "sofre" de melancolia acha-se inútil, incapaz, um fardo e/ou irritante. Mas mais importante ainda, o que fazer para ultrapassar estas situações? Bem, na minha opinião, e é tudo o que posso dar, sugiro que as pessoas comecem por arranjar um tempo e descansar, relaxar. Respirar fundo e pensar que as coisas hão-de melhorar também ajuda. Conversar com um amigo próximo, de confiança e que saiba ouvir é das melhores coisas a fazer em situações de abatimento. Pensar e fazer em algumas coisas que geralmente trasmitem sensações alegres. No meu caso concreto há um par de coisas que gosto de fazer e que me ajudam muito a melhorar o humor: cantar e ouvir musica dos meus tempos de criança. Não são aquelas musicas da carochinha, são aquelas que uma pessoa começa a ouvir quando vai para o 2º ciclo. Musicas mais "crescidas" que as da carochinha mas menos que as que ouvimos hoje. Talvez a lembrança desses tempos, para mim essencialmente os 6º e 7º anos, me transmita alguma confiança por terem sido tempos simples sem problemas, tempos inocentes. Quanto aos amigos, é sempre bom sabermos que temos aquele ou aqueles amigos especiais com quem podemos contar e que sabemos que estão sempre prontos a puxar por nós quando precisamos. E que quando nos vêm com má cara não descansam enquanto não virem um sorriso da nossa parte. Porque há aqueles que acham que as pessoas que fazem má cara devem fazer um esforço para parecerem felizes aos outros, como se isso os incomodasse. Se se sentem incomodadas não são nossos amigos.
Acabo este artigo, que talvez possa parecer que apareceu do ar (mas não!), com uma sugestão que é ao mesmo tempo um pedido: Olhem para vocês, olhem à vossa volta e se virem um amigo com má cara, ou que parece abatido, procurem ajudar, e lembrem-se que, enquanto a insistência cerrada pode piorar a situação, mostrar que vocês estão lá para quando for preciso é das ajudas mais preciosas que podem dar.