sábado, setembro 30, 2006

Conhecimento, Telepatia ou Ilusão?

“Pessoas que pensam que conhecem inteiramente outra(s) vivem uma ilusão – As pessoas são muito mais misteriosas que isso!”. Esta foi uma das muitas frases que o meu professor de Psicologia da Educação usou durante uma das suas aulas, num contexto completamente livre, e que me deixou a pensar.
Há não muito tempo eu era uma dessas pessoas que pensa que conhece completamente alguém mas verdade seja dita, sempre que isso aconteceu acabei desapontado, desiludido e portanto acabei por me aperceber que ainda não conhecia dessa pessoa tudo o que havia para conhecer!
Isto é uma realidade que vejo também muito à minha volta. Frases como “Conheço-o desde sempre” ou “ Não temos segredos para o outro” são frases que, embora algumas vezes ditas pela ocasião, frequentemente são ditas no intuito de mostrar que quem as diz é capaz de prever sempre o que vai fazer, dizer e pensar a pessoa sobre a qual é dito. Também há aquelas situações onde muitas vezes duas pessoas dizem coisas ao mesmo tempo ou onde uma delas diz, completa e arrogantemente ciente, o que o outro está a pensar (muitas vezes frases como “Leio-te os pensamentos” surgem neste contexto). Coisas deste tipo não significam, creio, que uma pessoa deixa de poder gerar mistério ou surpreender a outra mas sim que um certo tempo, muito provavelmente longo, de convivência leva a que pessoas entendam determinados padrões que outras pessoas cumpram. Mas muitas vezes estas “telepatias” ocorrem em determinado contexto, um curto período no dia de uma pessoa. E fora desse período? Por exemplo quando dois colegas de escola passam o período de aulas juntos é muito natural que nesse ambiente se venham a conhecer bem mas quando se encontram em casa, num ambiente familiar e completamente diferente do anterior, estas vertentes extra-sensoriais já não se revelam com tanta frequência, se sequer se manifestarem.
Outra frase que o dito professor referiu numa aula foi “Na maior parte dos casos as relações de amizade ou amor terminam quando duas pessoas deixam de constituir qualquer mistério, tornando-se completamente transparentes.” Eu concordo plenamente, não tivesse eu presenciado estes casos. Não querendo cometer o risco de parecer que me estou a contradizer ao achar agora que duas pessoas se possam conhecer por completo, o que quero dizer é que se duas pessoas chegam ao ponto de querer que isso aconteça, e explorarem demasiado a faceta que o prolongado convívio permite criar muito certamente essa insistência, geralmente abusiva, acaba por corroer a relação. Insistência, essa que pode dar-se a conhecer por uma exigência de conhecimento ou informação que uma pessoa pode pensar ter por direito mas não o ter de forma alguma.
Concluo com uma observação: Duas pessoas podem, e devem, relacionar-se, conhecer-se, dar-se uma à outra mas com o cuidado de nunca perder de vista que são duas pessoas distintas e que toda a gente tem o seu direito à individualidade. E às pessoas que geralmente cedem primeiro, falem, conversem, explorem a situação de forma a resolver questões que possam surgir antes de desistir pelo cansaço.


"Como as plantas a amizade não deve ser muito nem pouco regada", Carlos Drummond de Andrade

1 Comments:

At 5:22 da manhã, Blogger João said...

Concordo com o que dizes. Muitas vezes pensa-se que se conhece uma pessoa e espera-se certos comportamentos dela e quando ela faz algo diferente do previsto causa admiração pela positiva ou negativa. Nunca se conhece ninguém e, ainda que se possa prever algumas atitudes, pode-se sempre ter uma surpresa. Às vezes pessoas que julgamos boas têm atitudes más que não esperamos e que nos desiludem, outras vezes pessoas que julgamos más ou um pouco piores têm boas atitudes que revelam até algumas qualidades não tão comuns e nos surpreendem pela positiva. Para fazer um pouco de teoria longe de estar fundamentada, penso que a nossa mente é tão complexa e, como prova a ciência dos nossos dias, as ligações entre os neurónios no cerébro são tão numerosas que se torna humanamente impossível conhecer na totalidade a maneira de pensar de um ser humano. Sobre a questão do mistério, é curioso que já ouvi algumas raparigas referirem que gostavam de homens misteriosos e que quando acabava o mistério as coisas deixavam de ter graça. Também penso que a ânsia de querer saber tudo sobre o outro, para além de à partida ser impossível, pode invadir a privacidade do outro e, além disso, penso que toda a gente tem os seus segredos e, possivelmente, alguns até é melhor não os revelar, para não descer na consideração dos outros, o que não beneficiaria ninguém nem quem contava o segredo nem quem o ficava a saber, pois ficaria desiludido.

 

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