quarta-feira, setembro 06, 2006

Esclarecimento ao texto do síndroma de Estocolmo

Em relação ao post do síndroma de Estocolmo posso não ter sido claro em certos aspectos que quero esclarecer, o que me dá motivo para escrever mais um texto. Não era minha intenção dizer que era contra o perdão ou a favor de guardar rancor, pois sou o mais a favor do perdão e da tolerância que é possível, porque toda a gente tem os seus momentos infelizes e diz ou faz coisas precipitadas das quais se vem a arrepender. Mas, no caso do síndroma de Estocolmo, a afeição nasce ainda quando o crime está a ser cometido, não havendo portanto, naquele momento, qualquer sinal de arrependimento. Assim sendo, apesar de achar prudente conter a revolta e admitindo que o raptor tem, muito provavelmente, as suas qualidades, acho excessivos certos sentimentos que se estabelecem entre criminoso e vítima, enquanto dura o crime. Há-de haver razões que expliquem estes sentimentos e alguns podem ser justificados, o raptor pode inclusivamente ser delicado nalguns aspectos para a vítima, mas não deixa de privá-la da liberdade sem mostrar arrependimento. Há uma certa complacência e até um certo pacto com o crime que acho irracionais, o que não quer dizer que são completamente criticáveis; no caso da rapariga austríaca, ela fugiu porque não estava contente com a situação e fez bem, assim como não a criticaria se não tivesse fugido por medo de represálias e também compreendo que, tendo vivido quase toda a sua vida com o raptor, guarde uma certa nostalgia de certos momentos, mas no geral as pessoas tendem a simpatizar ainda enquanto raptadas. É curioso verificar que, por vezes, mesmo na sociedade mais alargada e não apenas neste casos restritos, encontram-se pequenos pactos com pequenos opressores, nem que seja por não se conhecer outra alternativa, numa espécie de "se não os podes vencer, junta-te a eles". Mas também acho que, se uma pessoa se mostra arrependida, a pena ou o castigo da sociedade deve ser reduzido, não se devendo massacrar quem está arrependido para que este não pense que não vale de nada arrepender-se e porque é desnecessário; a pena não deve ter uma função punitiva mas permitir que a pessoa e a sociedade possam melhorar e aprender, como escreveu o Marquês de Beccaria, jurista do século XIX, no livro Dos Delitos e das Penas e como também o escreveram outros autores do seu tempo, com quem concordo. E considero também que o facto das pessoas não se perdoarem é um problema bastante maior do que o síndroma de Estocolmo, que acho um fenómeno curioso produzido pela mente humana, mas tendo em conta o que as vítimas passam ou podem passar durante o período que dura o rapto, não deve ser objecto de grande censura. Ao escrever aquele texto quis dizer que considerava haver um comportamento típico em pessoas raptadas, mesmo nas mais inteligentes, que desafiava a regras da lógica, mas que há-de ter justificação.